Você passa horas tentando compreender um texto e nada. Perde a concentração na leitura a cada 30 segundos. Sofre para conseguir concluir um texto curto para a aula do dia seguinte. Se você vive uma situação dessas rotineiramente, então esta série de artigos pode lhe ajudar muito.
Aqui serão propostas as teses do filósofo aristotélico norte-americano Mortimer J. Adler, contidas na obra How To Read a Book, que deveria ser um dos primeiros livros a ser repassados aos estudantes ainda no ensino fundamental ou no princípio do ensino médio.
Trata-se de um programa de ensino de leitura que não se esgota. Universitários, professores e leitores curiosos e esporádicos terão benefícios incríveis se se debruçarem com afinco sobre o livro de Adler.
Lamentei por tão sábias orientações não terem chegado às minhas mãos ainda na adolescência.
O livro é um guia prático destinado a qualquer pessoa que queira elevar a sua capacidade de leitura.
São dicas simples, às vezes óbvias, mas extremamente úteis e aplicáveis por qualquer pessoa. Eu diria que são indispensáveis.
E qual a primeira lição?
RITMO
A aula não é de música, mas poderia até ser. Fluxo, tempo e respiração são fundamentais ao bom leitor.
A leitura precisa ter um ritmo, escreve Adler: há horas para se ler rápido e momentos para se ler devagar.
Ele compara a leitura à melodia e garante que se não tivermos ritmo, tempo e compasso, o resultado será puro barulho.
A falta de tal cadência é um dos principais motivos pelos quais muitos leitores sofrem para se concentrar nos textos.
Num piscar de olhos, numa respiração errada, lá se vai tudo. E o que se compreende? Exatamente: não se compreende nada.
ENTÃO, COMO SE DESCOBRE O RITMO?
O educador clássico dará a resposta com a formulação do seu método que desenvolve a prática da leitura em quatro níveis – elementar, inspecional, analítico e sintópico.
Inicio uma série de artigos para apresentar detalhadamente os ensinamentos do filósofo.
Antes de nos concentrarmos nos quatro níveis de leitura, precisamos atentar para um dado fundamental para compreender a proposta de Adler mas que pode passar muitas vezes despercebido. Para entender o que é ler de verdade, devemos guardar no espírito o seguinte:
TODA LEITURA TEM DE SER ATIVA
Você pode pensar: Uau, descobriu a pólvora…, mas calma. Vá devagar.
O que Adler quer afirmar é que não existe leitura passiva.
Ela é um ato da vontade, que requer esforço. É preciso exigir muito de si mesmo quando se está lendo.
Sim, claro mais, e daí?, você pensa novamente.
Bem, e daí que quando estamos atentos para que a leitura é uma atividade, mudamos toda a nossa atitude. Ficamos de prontidão. Sabemos que a leitura é uma tarefa laboriosa. Respeitamos os nossos inimigos: a dispersão, a preguiça, as ansiedades etc.
O erro mais comum entre estudantes ao se debruçarem sobre livros surge no início do seu momento de meditação. Começam a estudar já enfadados, desanimados ou dispersos.
Como o homem gentil que era, Adler quer nos lembrar que ler é trabalho ou como diria um bom nordestino cabra da peste: – Vai ler? Então acorda, meu filho. Leia aí com força, vai!
PRECISAMOS OUVIR E LER
Ler é uma ação com dois lados: um lado ativo, que inicia o movimento e um lado receptivo, que o finaliza.
É preciso capturar a mensagem disparada pelo escritor. Em uma comparação com o beisebol, o escritor é o arremessador (pitcher) e o leitor é o apanhador (catcher). Há uma técnica para o arremessador e uma técnica para o apanhador.
O QUE APRENDEMOS ATÉ AGORA? QUAIS FORAM AS MENSAGENS PRINCIPAIS DISPARADAS NESTE ARTIGO?
Aqui estão três:
1ª Captar a informação durante uma leitura depende de dedicação e de técnica.
2ª A leitura decorre de muitos atos individuais.
3ª Há graus diferentes de atividade na leitura.
A LEITURA TEM OBJETIVOS. OUTRA OBVIEDADE? ENTÃO VAMOS VER QUAIS SÃO ELES:
1) APRENDER O QUE QUER DIZER O AUTOR: PRIMEIRO OBJETIVO
Há muitas relações entre a mente e o livro. A leitura ativa é o processo pelo qual a mente se eleva por conta própria.
O que isso quer dizer? Ora, que a mente deixa de entender menos para entender mais.
Se não estivermos atentos para isso, vamos acabar pensando que ler é apenas absolver informações. E absorver informações é progredir em entendimento?
Para Adler, não.
O filósofo acredita que a leitura é um processo. E faz parte dele o fato de que não conseguimos entender um livro por completo. Quando o livro não é compreensível é sinal que ele tem algo a nos acrescentar.
Para entendê-lo, precisamos nos dedicar mais e entrar em operação com os símbolos do texto que está sendo lido.
2) LER PARA ENTENDER
Uma das chaves para melhorar a leitura é saber que há leituras para se informar eleituras para se entender.
Nós precisamos ler para entender quando reconhecemos que a obra é maior do que nós, que nosso conhecimento não é suficiente para decifrá-la. É o leitor que determina tal dificuldade, ou seja, nossa cultura adquirida até aqui nos ajudará ou não a entender uma obra.
Temos duas considerações que permitem a leitura para entender:
a) A desigualdade inicial de entendimento: temos uma batalha, um problema para decifrar pela frente que está além de nosso alcance.
b) Ter capacidade de se reduzir ou superar tal desigualdade. Adler acredita que qualquer pessoa esforçada e com a técnica correta tem capacidade de subjugar essa barreira.
3) LEITURA É APRENDIZADO
Adler acredita que a leitura deve ser uma aprendizagem, logo só podemos aprender com quem é superior a nós mesmos. Obviamente aqui, não há uma atitude de soberba. Pelo contrário, é um convite à humildade.
Leitura é aprendizado. Há uma diferença sutil entre ensino e descoberta.
O esclarecimento – descoberta – ocorre quando se aprende o que o autor escreve, o que ele quis dizer e porque quis dizer. Esclarecer-se depende de se informar, mas não devemos nos contentar com a informação.
A descoberta decorre de pesquisa, investigação e reflexão sem ajuda. Na leitura, é preciso haver descoberta.
Adler escreve:
Informar-se é simplesmente saber que algo é um fato. Esclarecer-se é saber, além do fato, do que se trata esse fato: porque ele é assim, quais as conexões que possui com outros fatos, em quais aspectos são iguais, em quais aspectos são diferentes”
4) APRENDER SEM PROFESSOR
Um aluno na sala de aula deve estar consciente de que o ensino é uma descoberta com auxílio. O leitor não tem professor ou auxílio direto. Para aprender, ele precisa recordar que leitura e aprendizagem são ativos. Pensa-se que ler e ouvir são atitudes fáceis, mas há um engano nisso.
Durante a leitura, é preciso saber lidar com o pensamento. Pensar durante o processo envolve ainda imaginação, observação apurada, memória rápida e sobretudo um intelecto treinado para fazer análises e reflexões.
O leitor precisa saber responder as suas próprias questões.
Precisamos entender por conta própria e aprender como fazer com que os livros nos ensinem.
Ler, assim como descobrir, é aprender com um professor ausente.
E esse processo de descoberta da leitura será toda a proposta de Adler.
No próximo artigo, iniciarei a descrição dos níveis de leitura. Serão abordadas, principalmente, a leitura Elementar e a leitura Inspecional. Não perca!
Sugestão de livro
A base da série de artigos tem sido a obra How To Read a Book, do filósofo Mortimer Adler. No Brasil, temos duas edições. Uma delas lançada com o nome de A Arte de Ler, pela editora Agir em 1957, que você pode encontrar na internet, e a segunda tradução foi recentemente lançada pela editora É Realizações intitulada Como Ler Livros (2011). A obra mais recente é a revisão do sucesso original de Adler. Vale muito a pena comprar.
Para mais informações, [você pode procurar o autor do artigo, André Lisboa], pelo email andrelisboax@gmail.com ou ainda no Twitter ou no Facebook.
Fonte: READTXT